sábado, 29 de novembro de 2014

Parabéns meu poema


Guilherme vou-te contar uma história. A tua. Desculpa ser longa. São 25 anos completos. E não cabem aqui. E aqui, felizmente, não é o twitter.

“You are the sunshine of my life” J
Há 25 anos, de visita ao hospital:
-Tem uma ruptura superior na bolsa d´água e vai ficar internada! (conversa de obstetra. Que sabem eles?)
-Ainda é cedo, o parto só está previsto para daqui a 12 dias! respondi convicta e sem deixar margem para dúvida aos médicos.
-Não! está para breve e não pode sair!
-Tenho de sair. Prometo voltar.
-Onde é que pensa que vai?
-Comprar uns chinelos de quarto, tomar banho e …buscar a mala, respondi em desespero de causa.
-Pode fazer tudo aqui e o seu marido traz-lhe os chinelos!
-Nem pensar. Tenho de ir a casa que é já ali!

Perante a minha insanidade temporária, a vontade irredutível, e como quase parecia o Obélix de gorda que estava, com medo de mim, deram-me um termo de responsabilidade para assinar. Ou isso, ou voavam das crocs com uma estalada do Obélix.

Caso nascesses entre a sapataria e o hospital, os médicos culpavam o Obélix. Saí a arrastar a pança, de perna aberta, numa triste figura, cheia de dores, com um futuro pai, desesperado e quase a ter um AVC, disposto a ser ele próprio a mãe a dar à luz, ou seja, escangalhando-me a beleza a caminho da sapataria.

Poucas horas depois, chinelos comprados, banho tomado, vários telefonemas feitos a avisar a família que os planos para receber o meu primeiro e único filho se antecipavam, com um pai à beira do ataque de nervos que originou um outro filme desconhecido do Almodôvar, dou entrada de novo, no hospital de Faro.

Na manhã seguinte, 29 de Novembro de 1989, acordo fresca a pedir para ir para casa. Estão a ver, eu é que tinha razão, afinal foi um falso alarme…
Qual falso alarme…o trabalho de parto decorria e eu não dava por nada. Com um livro me entretive, enquanto a natureza fazia o seu trabalho (não me lembro da história nem sei a razão…)

Para me distrair mais, ria-me e fazia rir. Pedi para me colocarem erva no soro, porque já não podia ouvir as mulheres lamurientas e queixosas ao meu lado…Não me ligaram. Aguenta! E em estado zen com o braço ligado à agulha! Sem espaço para fugir, fiquei à tua espera.

Horas depois, recebi um sms teu a dizer: mãe é agora! pedi para ir a correr ter com o médico para me ajudar a fazer cócó. Voei na cadeira de rodas e nem tempo tive de tirar o soutien…Foi um parto sexy em jeito de rapidinha (terás de ser tu a explicar o significado à Alice)!

Às 19:15 nasceu um conguito…
-Parece indiano. Tem os seus olhos, diz o médico.
-O padeiro é indiano…respondo esgotada de forças daquele momento esmagador na vida de uma mãe.
Nesse momento, o pai que tinha sido chamado de urgência a assistir ao parto e o perdeu por escassos minutos, entrou na sala e eu apontei para ele: cá está o padeiro!

Hoje há exactamente 25 anos, um quarto de século, que parece muito, mas foi ontem, o conguito transformou-se num belo homem. Tu próprio transformado em pai.
Filho de pai padeiro indiano sem ser uma coisa nem outra, mas de mãe disfuncional fez-se o que se pode. Com amor.

Chegaste um ser pequenino, delicado, frágil, introvertido, sereno, sempre num estado zen e muita preguiça.
Eu parecia uma leiteira pronta a mugir e foi necessário arranjar umas bébés, para dar de mamar e assim tu conseguires agarrar o bico da mama. Agradece por isso às tuas irmãs de leite, teres-te transformado num mamífero a beber leite materno até aos 11 meses.
A partir dessa data deixei de controlar na tua vida, o assunto mamas.

Fizeste um esforço tremendo para nascer, estavas de lado na pole position, mas tornaste-te forte, saudável e resistente. Recuperaste nas boxes. Sempre zen.
Um vulcão de criatividade em estado de aparente serenidade.

Desde o dia em que pulámos de alegria ao saber da tua vinda, até hoje, sinto-me honrada por me teres escolhido para tua mãe. Sinto-me plena e abençoada por me teres sido emprestado pelos Deuses e Deusas do Universo. Tenho um orgulho sem limites em ti.

Fico chateada quando me dizes: ”não mandas em mim, eu faço o que eu quiser” J Um filho nasce para obedecer à mãe J e tu contrarias essa suposta lei. Mas também dizes isso a toda a gente. Pensas pela tua cabeça. E ainda me orgulho mais por isso.

Tem sido uma aventura, ou direi antes, para ser fiel à nossa vida juntos: uma montanha russa.
Cheia de sustos, momentos delicados, avanços, recuos, discussões, sms cheias de emoção, asneiras, muitos abraços e beijos, desentendimentos, gargalhadas, gritos, partidas e regressos, muita conversa, mas sobretudo o maior amor que a vida nos dá a experimentar.

Contigo desperto a minha criança ao ver-te o olho brilhante, o coração recheado de sonhos, a alegria com que te entregas aos teus planos, a bondade do teu coração, a tua intuição apurada, a criatividade em ebulição, a reciprocidade, partilha e empatia que usas como princípios de vida e que te trouxe várias mãos cheias de gente linda para a tua tribo. Porque dás muito, recebes muito.
Seja o que for que estejas a fazer num momento colocas todo o teu entusiasmo e garra.
Não tens um sonho só. Quando um sonho se desmaterializa ou não se concretiza, já tens outro na manga. Tens um micro-cosmos de sonhos em cada momento da vida e apenas te encarregas de ver onde a vida te leva.
Esses são talvez os segredos do sucesso da vida, que não tem explicações para coisa alguma.

Aproveitas todos os momentos de felicidade. Como os orgasmos, sem pensares muito neles, vão acontecendo.
Fazes-me rir muito. Dizes-me como resposta aos problemas «a vida é mesmo assim» e eu questiono-me de onde te veio essa sabedoria?
Talvez do teu ser criança. E lá vem a minha criança abraçar-te. Hoje sou uma criança avó ainda mais radiante, quando te olho e vejo como pai. Sê sempre presente com amor na vida da nossa Alice e serás digno da riqueza que é ser pai.

Um dia ela vai querer saber de onde vieste e quem és. Não lhe contes a história da cegonha. Conta-lhe antes esta. É a tua vida. Baseada numa história real.

És o poema da minha vida. Se leres as quatro vogais da palavra poema, ao contrário, tens o poema que os filhos ensinam na vida dos pais: Ame-o.
Amo-te.

Espero continuar a aprender contigo, até perder a memória, a linguagem desta poesia que somos nós dois juntos.
Com este sentimento fico em puro estado de inexplicável felicidade interna.
Cantei-te “you are the sunshine of my life” quando nasceste e cantarei até ao final da nossas vidas juntos e além. És o sol da minha vida. Infinito vezes infinito.


Parabéns meu poema Guilherme.

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