6.30 da
manhã:
Acordo
com gritos violentos: ”minha senhora, minha senhora, sai de casa”
Dou um
salto da cama e levanto-me penosamente com os gritos que não param.
Como
sempre, estou em modo Calvin quando decide fazer arrumações: não sei onde está
a chave!
e
os gritos continuam…
“há
fogo minha senhora, sai de casa” e eu à procura das chaves…
Grito
também: “já ouvi! Não sei das chaves, não posso abrir a porta e se há fogo
alguém desligue o quadro da electricidade!
Estava
a dar demasiada informação…
O grito
colectivo mantém-se como se ninguém me tivesse ouvido.
Qual
cartoon…
10 anos
mais tarde…
eis que
as chaves aparecerem não sei de onde e desgrenhada e ramelenta abro a porta e
vejo um quadro que não sei se me escangalhava a rir se a chorar se panicar:
Por
trás de uma nuvem de fumo e umas labaredas, um grupo de empregados da casa
principal todos juntos a gritar e nos rostos lia-se o medo.
Virei
costas entrei em casa e fui a correr para o quadro eléctrico no lado oposto da
casa. Desliguei-o e fui perceber o drama.
“Afenal”um
canalizador tinha estado a substituir um cano e só substituiu metade. A outra
metade, continuava podre, corroída pela idade. Já lá estava desde que Bartolomeu
Dias dobrou o Cabo…
Colocou
terra em cima, o cano rebentou e o fumo que saía era ar a ferver…e chamas à
mistura perto de uma ficha eléctrica.
Não
percebi se o perigo foi real ou se podíamos ter morrido todos. Aos gritos. Ou
não.
Disse-lhes
que estava eternamente agradecida, sobretudo porque gritaram, mas não
desligaram o quadro…Eles queriam só salvar a “sua senhora”.
Como
ainda me restava meia hora de sono, não o desperdicei.
04.30
da manhã…
De um
salto estou sentada na cama sem perceber onde estou…enquanto ouvia um silvo:
allahhhhhhhhhh
O que
me fazia despertar?…
Cartoon
seguinte:
Eu
quase a descabelar-me… o allahhhhh continuava...
Afinal
era o maulane da mesquita na 1ª reza da manhã. Em cada aldeia, em cada esquina
há uma mesquita e o dia de rezas começa às 04,30…
Nunca
mais vou dormir à aldeia, sem levar tufos para os ouvidos! 2 pares!
Na
aldeia, onde vive a Vera “Blixen”, em cima da praia para onde vou
frequentemente, as pessoas vivem em comunidades estreitas quer se queira quer
não.
O
vizinho da Vera construiu a casa dele, geminada com a da Vera, em material
local.
Ela
sabe quando ele está na casa de banho, no quarto ou na sala pelos barulhos que
oferecem pistas.
O
vizinho não trabalha e descobriu o amor pela música e pelas motorizadas.
Daí a
comprar uma aparelhagem chinesa (naturalmente) em décima mão com más colunas
foi um pequeno passo na sua evolução como pessoa.
O som
ouve-se na aldeia vizinha, mas é na casa da Vera que a musica africana de
qualidade…se vive com intensidade!
E assim
despertamos muitas vezes…
tantas
que já deu direito a queixa e a um pedido de desculpa formal. Depois, acalmou.
Mas só
porque a aparelhagem morreu de repente. Foi a praga que lhe rogámos! Benditos
produtos chinas de curta duração!
As
motorizadas…bem, ele não tem guito para o gasóleo, apenas as põe a trabalhar às
05.00…para ouvir o som celestial do motor! Sobretudo agora que a aparelhagem
pifouJ. Numa de vingança contra as molungas.
Para lá
ir dormir preciso de 2 pares de tufos…
06 e
picos…
Cum
raio me caia em cima foi o que pensei quando saltei na cama!
Um
choro intenso e sofrido, muito muito alto. Magoava os ouvidos e a alma. Mas que
raio…
Era
sexta-feira, dia de sacrifício do cabrito na religião muçulmana. Estava a
acontecer ali mesmo no meu quintal.
E é
sempre assim, às 6as haja feira ou não, há sacrifícios.
3 pares
de tufos nos ouvidos são poucos!
“Minha
senhora não lhe vi 2 dois dias, onde estavas minha senhora? Estava muito
preocupado”. “Trouxe esta papaia para a minha senhora”
Eu
tinha ido passar o fim de semana para a praia e estas foram as palavras do meu
guarda (sim tenho um guarda, toda a gente tem) quando despertei.
Dorme
na minha porta e um dia destes que saí à noite, quando voltei, consegui a
proeza de abrir a porta de casa, saltar por cima dele e fechar a porta…sem o
acordar.
Pensei:
deve estar a usar os meus tufos…
Ahh e a
papaia? Agradeci e respondi: “quanto te devo?” “Nada! Apanhei num quintal para
ti”.
“Num
quintal? Então e os donos?”
“Não vi
ninguém, não tem dono… e há muitas lá, podem dividir”
Soube-me
ainda melhor o pequeno-almoço.